Luciano Candisani
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Primeiro aparece o filhote. Acomodado entre os galhos no alto da árvore, exibe um olhar assustado. Pelo seu tamanho, calcula-se que deve ter uns 6 meses de vida. Quando a canoa se aproxima a 3 metros do tronco submerso, dá para ver a mãe, uns 20 metros acima da linha d’água. Ela olha, dá uma espreguiçada como se estivesse enfadada para receber visitas, vira a cara e se afasta copa adentro. Tudo muito natural. "E então ficamos ali observando por uns 20 minutos, como se fôssemos babás, até que o filhote dormiu e decidimos partir", conta o biólogo carioca Emiliano Esterci Ramalho. Em cerca de dez anos observando a onça-pintada nas florestas de várzea da Amazônia, ele nunca tinha visto seu objeto de estudo tão à vontade naquele ambiente aquático.
A evidência de que antes suspeitava agora parece incontestável: dono de incrível flexibilidade ecológica, o maior felino das Américas pode viver no alto das árvores.
"Mesmo a 12 quilômetros do solo seco mais próximo, as onças não se sentiram ameaçadas e pareciam tranquilas em casa", conta Emiliano. Para o pesquisador da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que há seis anos monitora o ziguezague florestal dos bichanos, deparar ao vivo com a onça-mãe - apelidada de "Cotó" por não ter rabo - nessa condição é uma parte importante de um inédito quebra-cabeça ecológico: descobrir o que as onças fazem quando toda a floresta da Reserva Mamirauá fica alagada. Nenhum dos oito animais monitorados desde 2008 abandonou o ambiente inundável da várzea nos três ou quatro meses anuais de cheia - um comportamento inusitado e nunca antes observado em felinos de grande porte.
A evidência de que antes suspeitava agora parece incontestável: dono de incrível flexibilidade ecológica, o maior felino das Américas pode viver no alto das árvores.
"Mesmo a 12 quilômetros do solo seco mais próximo, as onças não se sentiram ameaçadas e pareciam tranquilas em casa", conta Emiliano. Para o pesquisador da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que há seis anos monitora o ziguezague florestal dos bichanos, deparar ao vivo com a onça-mãe - apelidada de "Cotó" por não ter rabo - nessa condição é uma parte importante de um inédito quebra-cabeça ecológico: descobrir o que as onças fazem quando toda a floresta da Reserva Mamirauá fica alagada. Nenhum dos oito animais monitorados desde 2008 abandonou o ambiente inundável da várzea nos três ou quatro meses anuais de cheia - um comportamento inusitado e nunca antes observado em felinos de grande porte.
Luciano Candisani
O biólogo Emiliano Ramalho, com a antena na mão (acima), tenta localizar as onças marcadas com colares de telemetria VHF e GPS na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, que fica a 1 hora de barca da cidade de Tefé
Emiliano conta essas e outras histórias dos felinos selvagens para um grupo de turistas hospedados na Pousada Flutuante Uacari, base para quem visita Mamirauá, quando o telefone toca. São 22 horas de uma noite de lua cheia em março, e uma emergência o obriga a interromper a palestra: um jovem bolsista que tinha saído pela manhã para instalar armadilhas fotográficas não havia voltado do trabalho de campo - assim como o guia "mateiro" que o acompanha.
Estudar um animal desse porte no ambiente inóspito da maior floresta do planeta (e a mais de 500 quilômetros da capital mais próxima, Manaus) é uma atividade de risco, e Emiliano teme pelo pior. Convoca por rádio moradores locais para o acompanharem, equipa-se, assume o volante de uma voadeira e desaparece na escuridão do Rio Solimões floresta adentro. Nós, visitantes, não sabíamos, mas os traiçoeiros rios da região já tinham feito o próprio pesquisador capotar com o bote metálico três vezes: duas delas ao passar sobre os gigantescos peixes pirarucus durante o dia e outra ao atropelar um jacaré à noite.
Nos dias anteriores, ao explorar uma milésima parte desse exuberante laboratório natural de mais de 1 milhão de hectares, eu já havia constatado que onças, pirarucus e jacarés são apenas alguns temas dos 104 projetos de pesquisa e manejo conduzidos atualmente em Mamirauá. Criada nos anos 1990 a partir do sonho do primatólogo José Márcio Ayres (1954-2003) de preservar o berço do uacari-branco (um macaco de cara vermelha que se acreditava só existir ali), a primeira reserva de desenvolvimento sustentável do Brasil nasceu com um conceito inovador para a época: proteger o peculiar ambiente de várzea amazônico, produzir ciência de qualidade e envolver as populações tradicionais na conservação das espécies - em vez de tirá-las de seu universo, como era feito até então com o pretexto de que toda área de conservação deveria ficar intacta.
Estudar um animal desse porte no ambiente inóspito da maior floresta do planeta (e a mais de 500 quilômetros da capital mais próxima, Manaus) é uma atividade de risco, e Emiliano teme pelo pior. Convoca por rádio moradores locais para o acompanharem, equipa-se, assume o volante de uma voadeira e desaparece na escuridão do Rio Solimões floresta adentro. Nós, visitantes, não sabíamos, mas os traiçoeiros rios da região já tinham feito o próprio pesquisador capotar com o bote metálico três vezes: duas delas ao passar sobre os gigantescos peixes pirarucus durante o dia e outra ao atropelar um jacaré à noite.
Nos dias anteriores, ao explorar uma milésima parte desse exuberante laboratório natural de mais de 1 milhão de hectares, eu já havia constatado que onças, pirarucus e jacarés são apenas alguns temas dos 104 projetos de pesquisa e manejo conduzidos atualmente em Mamirauá. Criada nos anos 1990 a partir do sonho do primatólogo José Márcio Ayres (1954-2003) de preservar o berço do uacari-branco (um macaco de cara vermelha que se acreditava só existir ali), a primeira reserva de desenvolvimento sustentável do Brasil nasceu com um conceito inovador para a época: proteger o peculiar ambiente de várzea amazônico, produzir ciência de qualidade e envolver as populações tradicionais na conservação das espécies - em vez de tirá-las de seu universo, como era feito até então com o pretexto de que toda área de conservação deveria ficar intacta.
Luciano Candisani
A criança salta para o rio em uma das comunidades de Mamirauá. Assim como para os animais da mata, a água determina o ritmo da vida ao longo do ano.
A pesquisa sobre os hábitos arborícolas e aquáticos das onças-pintadas na várzea amazônica atrai a atenção da sociedade científica internacional.
Postado Por Pr. Alair Alcântara
Liberdade
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